Famílias e especialistas compartilham seus melhores conselhos para enfrentar e lidar com a situação
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Especialistas dão dicas de como viver esse período de forma mais leve — Foto: Anna Parini/The New York Times |
Inicialmente, Madhavi pensou que se tratavam de sinais normais do envelhecimento. Mas, à medida que os sintomas se agravavam, decidiu levar a mãe para uma avaliação médica. Cerca de dois anos atrás, veio o diagnóstico: doença de Alzheimer.
Segundo Madhavi, a confirmação trouxe alívio por explicar o que estava acontecendo, mas também um sentimento profundo de tristeza e impotência.
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— Pensei: talvez hoje seja o melhor dia do resto da vida dela — recorda. — Ainda assim, decidi aproveitar ao máximo o tempo que ainda teria com a mãe.
Saber como agir após o diagnóstico de demência pode ser confuso. Especialistas recomendam, já no início, tomar decisões práticas: nomear alguém de confiança para responder por questões médicas, planejar os cuidados futuros e organizar documentos financeiros. Mas também é preciso se preparar emocionalmente para o processo de perda gradual da pessoa que se ama.
— É como morrer aos poucos, mil cortes mentais — define Don Siegel, de Silver Spring, Maryland, cuja esposa, Bette, faleceu em 2024 após alguns anos com demência por corpos de Lewy. — Você convive com alguém que, na maior parte do tempo, você já não reconhece, exceto por breves instantes.
O New York Times ouviu especialistas e sete famílias que já passaram por essa experiência para reunir conselhos práticos e emocionais sobre como seguir em frente após o diagnóstico.
Adapte-se à nova realidade do seu familiar
Aceitar que um ente querido perdeu habilidades cognitivas, como pensar com clareza ou se lembrar de eventos simples, é um dos desafios mais difíceis. Muitos familiares tentam argumentar com a pessoa com demência ou corrigir informações erradas, mesmo quando são absurdas. Isso pode ocorrer por frustração, ou pela falsa esperança de que, com correções, a pessoa recupere sua memória.
— Isso não apenas não funciona, como geralmente piora as coisas — explica o neurologista James Noble, da Universidade Columbia, autor do livro Navigating Life with Dementia (em português Navegando a vida com demência). — Tentar convencer ou confrontar a pessoa pode deixá-la ansiosa, ou agitada, o que acelera a progressão da doença e torna o cuidado ainda mais difícil.
Segundo Ipsit Vahia, chefe de psiquiatria geriátrica do McLean Hospital (em Belmont, Massachusetts), o ideal é que os familiares "entrem com delicadeza na realidade da pessoa, acolhendo delírios ou confusões sem confronto direto".
Hoje, Chanda vive com o marido e a filha. À noite, seguem uma rotina previsível, assistindo a programas curtos de música e à versão indiana do programa "Quem quer ser um milionário?", já que ela não acompanha mais filmes longos. Em vez de fazer perguntas abertas (que causam ansiedade), Madhavi prefere simplesmente contar como foi seu dia.
— Fazemos pequenos ajustes para que ela sinta que sua vida segue igual — conta a filha.
Faça as perguntas difíceis o quanto antes
Logo após o diagnóstico, é importante conversar com a pessoa afetada sobre como ela gostaria de viver seus últimos anos. Isso inclui decisões sobre tratamentos, internações, preferências quanto à permanência em casa ou mudança para instituições, e o uso (ou não) de sondas, suporte de vida ou hospitalizações prolongadas, orienta Christina Prather, diretora clínica do Instituto de Saúde Cerebral e Demência da Universidade George Washington.
Seja um defensor firme do paciente
Muitas famílias relatam que obter atendimento de qualidade para demência exige persistência. O primeiro geriatra de Chanda deixava-a nervosa com sua postura ríspida. Então, Madhavi procurou outro médico, e escolheu o Vahia, que fala marati, idioma da paciente, e a trata com respeito, o que a tranquiliza.
Prather sugere que os familiares levem uma lista de dúvidas às consultas, e peçam contato posterior, se necessário. Ela ressalta que os médicos não têm todas as respostas: a evolução da demência depende da causa e das condições de saúde da pessoa, e é frequentemente imprevisível.
Encontrar cuidados de longo prazo também exige vigilância. Com o agravamento da demência, Bette, antes gentil, passou a ter acessos de raiva e precisou de contenção física. Don cuidou dela sozinho por anos, mas depois a internou numa instituição especializada em demência. No entanto, o local não estava preparado para lidar com os sintomas agressivos da demência por corpos de Lewy.
— Tive que microgerenciar o atendimento o tempo todo — conta. — Depois, transferi minha esposa para uma estrutura menor, onde recebeu cuidados melhores.
Busque apoio
O cuidado com alguém com demência costuma se estender por vários anos, e é psicologicamente desgastante.
— O cuidador percorre um caminho longo — afirma Noble.
Por isso, é essencial buscar apoio emocional, em grupos de cuidadores, na psicoterapia ou em rede de apoio familiar, e cuidar da própria saúde física e mental.
— Ninguém entende o que um cuidador passa — desabafa Don.
Ele só conseguiu algum alívio depois que procurou uma terapeuta especializada em cuidadores e começou a participar de grupos de apoio.
Aproveite os pequenos bons momentos
Algumas famílias relatam que a progressão da demência ocorre em etapas, com longos períodos de estabilidade seguidos de declínios. Outras dizem que os sintomas avançam de forma imprevisível.
— Cada fase da demência é passageira
— diz a dra. Prather. “O que você está vivendo agora vai mudar.”
Diante da incerteza, as famílias recomendam celebrar pequenas vitórias, encontrar alegria e rir sempre que possível. Melanie Levy, treinadora física em Sacramento, Califórnia, conta que seu pai, que morava sozinho e recusava ajuda, ainda se divertia tocando percussão e ouvindo discos, mesmo com o avanço da demência. Saber que ele estava “organizando um clube de jazz na sala de casa”, mesmo que só para ele, era reconfortante.
Ela também relatou que, por esquecer antigas mágoas, ele voltou a se aproximar de parentes com quem não falava havia anos.
Don também se recorda de momentos de lucidez e humor de Bette, mesmo nas fases finais. Em uma dessas ocasiões, ela zombou de uma torta feita por ele anos antes, na qual ele trocou açúcar por sal.
— Você vive por esses momentos — disse. — No meio do pesadelo, havia lampejos de clareza e humor. E, ocasionalmente, minha esposa reaparecia.
Fonte;oglobo.globo
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